Ter um acidente vascular cerebral ou dito de forma simples, um AVC, é algo com fortes repercussões ao nível, físico, psicológico e socioeconómico que necessita de uma intervenção rápida, especializada e continua para uma possível recuperação rápida e eficaz. Decidi partilhar através destas palavras a minha surpresa ao ver um excerto de um programa televisivo muito publicado nas redes sociais em que um senhor de 78 anos tem um acidente vascular cerebral em directo e ninguém reparou, ou aparentemente não. Num minuto entra em cena alguém completamente autónomo e pro-activo e passados breves minutos saí limitado como foi o caso do entrevistado. Perguntei-me: será que ninguém reparou? A diferença na dicção, um braço literalmente pendurado no cadeirão, o senhor a escorregar… Será por falta de informação ou apenas porque simplesmente ninguém observou estes primeiros sinais? Não decidi escrever para julgar, mas para informar sobre o que é um acidente vascular cerebral, as manifestações clínicas e o que fazer.
O que é um Acidente vascular cerebral?
É num défice neurológico, focal, de inicio súbito, resultante da interrupção da irrigação sanguínea cerebral que se prolonga por mais de 24 horas, podendo causar uma lesão irreversível. Trata-se de uma situação patológica que afecta tanto os vasos sanguíneos, como o tecido cerebral. Pode ser isquémico, que corresponde a cerca de 80% dos casos e que consistem na oclusão de uma ou mais artérias, sendo que o tecido que era irrigado pelas mesmas sofre défices de oxigénio, ocorrendo a morte cerebral. Pode ainda ser hemorrágico quando uma artéria se rompe e o sangue extravasa para o tecido cerebral, como consequência, por exemplo, de uma crise hipertensiva. Pode surgir um outro tipo de situação: os AIT´s, ou seja, os acidentes isquémicos transitórios. Nisto, a chegada insuficiente de sangue a determinadas partes do cérebro durante um curto período de tempo produz esta situação patológica. Dado que se verifica um restabelecimento rápido do fluxo sanguíneo, o tecido cerebral não morre, como acontece no AVC. Não menos preocupante, esta condição é frequentemente um aviso precoce de um acidente vascular cerebral. Infelizmente já verifiquei a sua veracidade.
Factores de risco e prevalência:
A idade, sexo e raça são factores de risco que não são possíveis de mudar, sendo por isso imutáveis. A hipertensão, a doença cardíaca, a diabetes mellitus, as anomalias lipídicas do sangue, o tabagismo e o sedentarismo são mutáveis. A sua presença pode aumentar o risco de vir a ter um AVC. Infelizmente o acidente vascular cerebral é uma situação clínica que não afecta apenas as pessoas com mais de 65 anos, que fazem parte dos 88% de ocorrências. Por outro lado, graças à tomada de consciência das pessoas sobre a importância de controlar a tensão arterial e os níveis de colesterol, a incidência da doença vascular cerebral tem vindo a diminuir nas últimas décadas.
Como identificar uma pessoa que acabou de ter um AVC: manifestações clínicas
O modo como o acidente vascular cerebral afecta o organismo depende precisamente da área onde se interrompeu a irrigação cerebral ou onde se produziu a hemorragia. Cada área do cérebro é irrigada por vasos sanguíneos específicos. Por exemplo, a obstrução de um vaso na área que controla os movimentos musculares da perna esquerda produz debilidade ou paralisia nessa perna. Manifestações clínicas evidentes: boca torta para um dos lados, hemiparesia ou hemiplegia do lado do corpo contralateral ao local da isquemia, dificuldade em engolir e em falar, resposta diminuída à sensibilidade superficial, défices visuais, síndrome de negligencia unilateral, défices de memória.
Há recuperação possível e total?
As consequências de um acidente vascular cerebral dependem da rapidez com que se inicia o tratamento, já que não se trata de uma ocorrência de “tudo ou nada”, antes origina alterações celulares progressivas. Felizmente há recuperação. Nem sempre a 100%, mas se houver um acompanhamento precoce por uma equipa multidisciplinar será possível recuperar algumas das funções anteriormente presentes.
O que fazer?
Perante uma situação destas, há que identificar as manifestações clínicas, como pedir à pessoa para sorrir, tentar levantar o braço lesionado e falar. Posteriormente contactar de imediato o 112 a relatar o ocorrido. A pessoa será então assistida por uma equipa médica especializada. Há que manter a calma e tentar transparecê-la para a vítima. Agora lanço o desafio de todos contribuirmos para a literacia em saúde, começando pelos canais televisivos (programas da tarde, novelas, etc) como uma das fontes privilegiadas para o ensino em saúde.